sexta-feira, setembro 10, 2004

Dilatar o tempo

Ao dançar, um dos conceitos com que rapidamente nos familiarizamos é o tempo... No início, muitas vezes estamos presos aos tempos, tentado desesperadamente mexer um pé em cada tempo da música.

A pouco e pouco, deixamos esta forma digital de encarar a música e começamos a sentir o “tempo entre cada tempo”. Ao sentirmo-nos mais à vontade com os passos de salsa e com o nosso corpo, vamos tirando cada vez mais proveito do tempo... do tempo entre cada tempo. Em vez de colocar mecânica e apressadamente o pé para o lado, descobrimos que o podemos arrastar, aproveitando a plenitude do tempo para tornar o passo mais confortável, mais agradável. Começamos a dilatar o tempo. Aquela volta que fazíamos de forma sistemática de repente torna-se numa dupla volta, em que ainda sobra tempo para sorrir e pegar delicadamente na mão do nosso par. Um son, uma kizomba, podem tornar-se numa eternidade mágica.

Dilatar o tempo... não é isso que torna aquela salsa, aquele son, aquele danzón, aquela kizomba tão especial? A forma como um pequeno movimento parece prolongar-se por uma doce eternidade, em que temos tempo de nos abandonar antes da batida seguinte da música?...

Na salsa, como na vida, a dilatação do tempo é um conceito fundamental. De um ponto de vista bem mais prático, mas também bem mais crítico, a dilatação do tempo é aplicada desde sempre. Ao longo da história, e talvez mesmo antes desta, há relatos de feitos conseguidos através da dilatação do tempo... Pessoas que evitaram acidentes de automóveis porque naquela fracção de segundo tiveram tempo de fazer uma análise detalhada da situação e tomar a decisão certa... Prisioneiros de guerra que resistiram à tortura por conseguirem, entre cada choque eléctrico ou cada chicotada, prolongarem o tempo de forma a deixarem passar a dor, desfrutarem o momento e prepararem-se calmamente para a próxima... Os exemplos são muitos, a ideia central a mesma.

Dilatar o tempo será uma capacidade que todos nós podemos desenvolver e aplicar nas mais diversas situações do dia a dia. Nas mais críticas, mas também nas mais “sabrosas”.

Prefiro deixar de lado a ideia da tortura ;) centrando a dilatação do tempo na salsa. O tempo sempre foi e sempre será um conceito relativo. Há algum tempo atrás, curiosamente numa festa de salsa, vi escrita a seguinte frase num WC, naqueles pequenos painéis publicitários que por lá proliferam:

“O tempo que demora a passar um minuto depende de que lado da porta da casa de banho estamos”.

Embora de conteúdo menos artístico, esta frase é para mim uma das que melhor descreve este conceito milenar.

Um salsa, apesar de rápida pode ser dançada com muita calma. Um son, apesar de lento pode ser um stress. O tempo é aquilo que fazemos dele. O ritmo da salsa é elástico e é no seu aproveitamento que reside um dos prazeres da salsa!

Dilatar o tempo; dilatar o prazer.

2 Comments:

Blogger Salseira said...

Cubanita, cubanita já te vi mais sonhadora... ;)

Uma das melhores coisas que se aprende com a Vida é que o Tempo é nosso amigo. O tempo tudo resolve, traz-nos serenidade, apaga as mágoas, acalma a dor. O que eu acho dificil de aprender é a utilizar o tempo a nosso favor. Ou seja, aprender a prolongar os momentos de prazer e a tornar mais curtos os momentos de dor, ou desprazer.

Não sei como se pode fazer tal coisa. Aliás, não consigo fazer tal coisa. Mas tenho uma ideia de como pode ser feito e é isso que tento fazer.

Nos momentos de prazer devemos concentrar-nos nesse momento, naquilo que nos está a dar prazer, devemos estar muito atentos para não deixar fugir nenhum momento de felicidade. Ou seja, por exemplo, numa salsa devemos concentrar-nos nessa mesma salsa e no prazer que estamos a retirar dela.

Nos momentos de dor temos que nos concentrar não nessa dor mas nas outras coisas que ainda nos dão prazer, apesar da dor. Por vezes, é necessário alienarmo-nos um bocadinho da realidade e só voltar a ela quando já estivermos mais calmos para resolver as coisas, nem que seja só na nossa cabeça.

Não sei se fiz sentido, Cubanita. Espero que sim. Agora dizer-te se sabes viver ou não ninguém te pode responder... só tu mesma!

Espero que esta semana passe mais depressa que a outra!

13/9/04 14:18  
Blogger Salseira said...

Deixar no passado os momentos da vida que já acabaram

É importante saber quando uma etapa chega ao fim. Se insistirmos em permanecer nela mais do que o tempo necessário, perdemos a alegria e o sentido das outras etapas que precisamos viver. Encerrando ciclos, fechando portas, abrindo janelas, terminando capítulos, não importa o nome que possamos dar, o que importa é deixar no passado os momentos da vida que já se acabaram.

Para mim, também isto tem a ver com a importância do Tempo!

13/9/04 15:54  

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